segunda-feira, 10 de outubro de 2011

A DANÇA DOS ORIXÁS

Sensual, guerreira, manhosa, a dança dos orixás é fascinante. Das mais de quinhentas danças que a interligação de culturas semeou de norte a sul do território brasileiro, três fontes ficaram evidenciadas: a indígena, bem caracterizada pela coreografia dos caboclinhos (ou cabocolinhos) originários dos cucumbis; a européia, através do pezinho, das tiranas ou dos schottish, e, por ultimo, a influência africana, via candomblé e umbanda. As danças dos orixás são a razão determinante do fascínio e da multicriatividade que se vê comumente nos passos do samba na atualidade.

Com suas cores, metais, alimentos, domínios no Universo, saudações e, aqui ressaltadas, as danças, os orixás povoam a cultura brasileira desde os tempos da colonização. Estão presentes em todas as nossas artes, notadamente no samba, um dos símbolos internacionais da brasilidade. De suas coreografias deve-se ressaltar:Bravun, de origem keto, é o ritmo percutido com varetas, que rege a dança dos Exus, com domínio nas aberturas de rua e encruzilhadas. Mensageiro por excelência, Exu apresenta-se numa dança serpenteada, as mãos ora levantadas para o orun (céu), ora para o aye (terra), os quais ele interliga. A comissão de frente nas escolas de samba, em especial a partir dos anos 60, executa inúmeros de seus passos.


É também no ritmo bravun que se realiza a dança de Ogun, orixá do ferro. A coreografia de Ogun tem a dança bem agitada, os passos mais acelerados, braços movimentados para o alto e à frente, na horizontal, nesta última parte como a cortar lanças e defender-se de adagas com escudo imaginário, ações típicas de sua essência guerreira.Aguerê é a forma coreográfica com a qual se expressa Oxossi, o dono das matas. A dança de Oxossi é de especial beleza. Muito rápida, compõe-se de inúmeras fugas e contrafugas. Em esquivas ligeiras, projeta o bailado por toda a extensão do ambiente. O corpo corcoveia, vai ao chão, pára, observa e retoma as mesmas atividades anteriores. Não tendo a posse do arco e flecha, símbolos de Oxossi, quem para ele dança abre o polegar e indicador da mão direita, formando um angulo reto, enquanto os demais dedos desta mão se fecham. O indicador da mão esquerda, esticado, toca a falange, a falange o polegar da direita, criando a imagem do arco engatilhado.

O aguerê é também o ritmo para a coreografia de Iansã, que domina os ventos e a tempestade. Além da rapidez, das fugas e contrafugas próprias de Oxossi, a dança de Iansã tem como propriedade feminina o enlaçar dos braços. A partir desses meneios desenvolve-se o "iruechim", uma ondulação flutuante de mãos com os braços erguidos, comumente chamada de quebra-pratos, e na qual se utiliza um feixe de fios de rabo de cavalo. O "iruechim" é uma evocação aos eguns (espírito dos mortos), simbolizando a vida física que se quebrou, se foi, ou melhor, passou para outro estágio.

Vamos então passar para a dança de Oxumaré, que tem nas sete cores do arco-íris o seu domínio. Sua coreografia é toda serpenteada (sendo a serpente um de seus símbolos), ainda trabalhando-se com o Aguerê.

A nação ijexá empresta seu nome ao ritmo fracionado - quebradinho - e também a forma de dança que dele advém. O ijexá é a animação coreográfica de orixás poderosos, a exemplo de Oxum, a deusa da água doce e do amor, e Iemanjá, a deusa do mar e da maternidade. Seus passos no ijexá são miúdos, lentos, delicados. Lua, meia-lua, como reproduzem os bailarinos clássicos ao representa-la. Os braços de Oxum e Iemanjá conduzem o ritmo do corpo como se fora a puxada de remos, ora para frente, ora para trás. Elas reproduzem também uma sensual mexidinha dos ombros. Orixás da beleza, do encantamento, essas deusas dançam segurando e batendo a barra da saia, para onde olham, como a procura da imagem de suas graças no espelho das águas.

O ijexá é igualmente usado na dança de Ossanha, que se reproduz em passos semicirculares, a perna direita a frente da esquerda, rastejando a planta dos pés ora para direita, ora para esquerda. Ossanha dança com os braços e mãos multidirecionados, como a distribuir as folhas e raízes da sua essencialidade curativa.

Opanijé é a coreografia de Omulu, Obaluaê, que dominam o sol, a terra e, notadamente, as doenças epidêmicas. A dança é exercida em três passos a um lado, os braços erguidos ao céu; igual andamento para o outro lado, novamente os braços alçados. De volta a base, então os três passos serão para frente. Sem tirar nem por, é um dos principais movimentos das alas carnavalescas para se arremeterem a frente sem abrir claros na harmonia do desfile das escolas de samba.

Alujá é a dança de Xangô, a mais viril e agressiva de todas as coreografias dos santos africanos, já que é este o dominador do raio, do fogo e, sobretudo, da justiça. Como guerreiro, sua coreografia é dominada pela simulação de golpes de machado, um de seus símbolos. Num momento, ele rasga o espaço para frente, noutros cruza sua arma com o imaginário opositor. De forma impetuosa, uma coxa a frente, o tronco e impulsionado para frente e, em seqüência, para um dos lados a coreografia vai ocupando todo o espaço que lhe é dado. Para executa-la bem, há de ter muito vigor físico.

O ibin tem duas vertentes, porque o próprio orixá Oxalá se subdivide. Quando aparece como Oxaguian, sua coreografia tem mais vibração, mas é executada a passos curtos, curtíssimos, para a direita e esquerda, ao tempo em que os braços movimentam-se para o alto, elevando sua espada para o céu. São passos semelhantes aos de Ogum, contudo, regidos pela brandura e suavidade. Como Oxalufan (o Oxalá mais velho), ao dançar, a composição do corpo é arqueada. Amparado no Opaxoro (o cetro) ele praticamente caminha, passo a passo, com intervalos vibratórios da cabeça aos pés. A coreografia de Oxaguian dá postura as baianas das escolas de samba, excetuando-se a rodada do corpo.


Texto de José Carlos Rego

Nenhum comentário: