O Ritual da Cura ou Fechamento de Corpo praticado em muitos candomblés na Sexta Feira da Paixão, que é uma data que os católicos dedicam à memória da crucificação de Jesus Cristo, tem origem nas mais antigas práticas bantos de calundus (formações religiosas anteriores à formação do candomblé modelado pelo Ketu na Bahia).
Algumas tradições Jeje Mahi, formações de candomblés Nagô Vodum, e Jeje Nagô principalmente, absorveram, em sua formação, do elemento banto presente no Recôncavo Baiano, tal tradição, umas casas como as de Candomblé de Angola realizam na Sexta Feira da Paixão e outras tradições segmentadas e formações não propriamente no dia santificado dos católicos, mas em etapa anterior ao sacrifício do bicho de 4 patas do rito de iniciação.
A “cura” é uma denominação para a “cruza ou cruz”, sinal recebido dos mercadores e traficantes de escravos para marcá-lo e distinguí-lo dentro de um grande número de indivíduos, principalmente assim agiam os mercadores e traficantes espanhóis, portugueses e brasileiros (muitos referidos ao longo da História como sendo portugueses). Tal símbolo era marcado nos braços, peito, costas dos escravos de forma a marcá-lo com sendo já batizados e portanto que já haviam recebido o nome pelo qual deviam ser conhecidos doravante, só então depois eram conduzidos ao Brasil em navios negreiros. Tal flagelo atendia a grandes encomendas de escravos principalmente para o árduo trabalho da lavoura no Ciclo da Cana de Açúcar.
Em fongbè (Língua Fon) a cruz é denominada kluzú (pronunciando-se curuzú, que dá nome a uma localidade em Salvador, Bahia). Para o indivíduo banto de forma geral e principalmente no Brasil ficou entendida como “cura”. Também no Brasil muitos índios entenderam o símbolo da cruz como curuçá ou cruçá a partir dos Jesuítas, passando assim a denominá-la.
O segredo do Fechamento de Corpo no Ritual da Cura está no que lhe é passado depois da marcação do sinal e o que é rezado naquele momento, diferindo os ingredientes passados e ingeridos e as rezas de acordo com o candomblé.
Durante o primeiro processo de iniciação, que normalmente tem a duração de 21 dias, são diversos os rituais que têm lugar, e pelos quais os Yaôs têm que passar para poderem receber o seu Orixá de forma íntegra.
São tomados diversos cuidados para que o iniciado possa de facto, dali para a frente estar munido do conhecimento necessário, mas também de defesas necessárias, uma vez que vai nascer para a sua “nova vida”.
Não se trata só de munir e proteger o espírito das defesas necessárias, mas também o seu corpo físico, e nesse âmbito, são feitas as chamadas Kuras.
As Curas são incisões feitas no corpo do Yaô, que por um lado representam o símbolo de cada tribo, como o símbolo de cada Ilê (casa ou terreiro), mas têm o objectivo de fechar o corpo do Yaô, protegendo-o de todo o tipo de influência negativas.
Para isso são feitas as incisões (o que chamamos de abrir) e nessas incisões é colocado o Atim (pó) de defesa para aquele Yaô (iniciado). O Atim tem uma composição base de diversas plantas e substâncias, mas o Atim utilizado para as Kuras, contêm também as ervas do Orixá daquele Yaô em quem ele vai ser aplicado.
Sabemos que em algumas casas a Kura pode também ser tomada como infusão de ervas, porém na maioria das Casas de Candomblé, as Kuras, que são de origem Africana, são feitas como incisões ou cortes, e nesse cortes são colocados pequenos punhados de Atim, para que esse Atim penetre no corpo e o proteja de males exteriores enviados contra a pessoa.
Normalmente, as Kuras são feitas no peito, dos dois lados, nas costas, também dos dois lados e nos braços; evitando assim que de frente, de costas ou no manuseio de qualquer coisa algo negativo possa entrar no corpo do Yaô.
Além dessas, na feitura do Santo, abre-se também o Farim, que é uma Kura no centro do Orí, do Yaô, que por um lado impede também que algo de mal possa entrar na cabeça do Yaô, mas que facilita também a ligação com o seu Orixá. É comum também fazer-se na sola dos pés para evitar que o pisar de algo negativo possa interferir com o Yaô, havendo ainda, alguns zeladores que fazem uma Kura na língua dos seus Yaôs, para que os mesmos não comam comidas “trabalhadas”, e caso as comam, para que essas comidas não lhe façam mal.